por paulo eneas
O evento governista oficial realizado nesta segunda-feira (08/01) alusivo aos trágicos episódios de Oito de Janeiro do ano passado foi na contramão do pretenso apelo petista à pacificação do país. Organizado a pretexto da defesa da democracia e das instituições, um evento oficial do governo brasileiro serviu de palco para alimentar no plano retórico o radicalismo e a cismogenia que contaminam o ambiente político e institucional do país há anos.

A própria ideia de um ato oficial de governo alusivo ao Oito de Janeiro já constitui-se por si mesmo uma inadequação, o que foi claramente percebido por outros agentes políticos, como governadores e políticos do Centrão, como o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), que deixaram de comparecer ao evento.

Por óbvio, não há nada a ser celebrado no Oito de Janeiro e nos seus desdobramentos. A defesa da democracia tem que ser feita antes pelo reconhecimento da pluralidade de ideias políticas que circulam na sociedade e pela premissa básica de que todos estão sujeitos à lei, que deve ser aplicada com observância plena do devido processo legal e do direito ao contraditório. Foi desta forma que o modelo de regime democrático foi concebido pelos seus autores clássicos no passado.

O evento de ontem também teve uma componente política mais sutil: é fato que a frente ampla que criada em torno de Lula alijou as alas mais radicais do PT de posições importantes e estratégicas no governo, o que tem gerado críticas duras desses segmentos de esquerda à diretrizes do governo petista.

Lula vem desde o início do governo acenando a estes setores mais esquerdistas por meio de exercícios retóricos que incluíram o embate pesado com o Banco Central no início do governo, e a sustentação permanente do embate retórico puramente ideológico com o bolsonarismo.

Os petistas sabem que a radicalização e tensionamento retórico e ideológico permanentes geram efeitos apenas em nichos eleitorais específicos. Da mesma forma o sabem os bolsonaristas, de modo que a manutenção desse embate é de interesse ambos os lados, que ganham em termos eleitorais específicos com a manutenção da polarização retórica. Quem perde obviamente é o País, como já vem perdendo nos anos recentes.

Ocorre que a ala majoritária petista também sabe, como a própria experiência bolsonarista no governo mostrou, que radicalização ideológica permanente não garante em si a reeleição, mas sim a entrega de resultados, o que por sua vez depende do Centrão, onde estão alojados os bolsonaristas.

Portanto, grande parte do que vimos neste um ano do Oito de Janeiro foi mais um embate no plano retórico entre as duas forças políticas majoritárias e praticamente hegemônicas no país. Um embate que tem por alvo as bases eleitorais de cada uma destas forças, o que gera um processo de retroalimentação permanente da cismogenia que ainda persiste no país, jogando assim por terra qualquer apelo à pacificação. Colaboração Angelica Ca.

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