por paulo eneas
O apoio dado pelos bolsonaristas para a aprovação do nome do Dr. Cristiano Zanin para a vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal coloca uma pá de cal em qualquer ilusão que ainda possa haver sobre as verdadeiras relações entre petismo e bolsonarismo.

O indicado do petista Lula obteve 58 votos no Senado, 9 votos a mais do que aqueles obtidos pelo senador governista Rodrigo Pacheco (PSD-MG) quando de sua reeleição para presidência do Senado Federal em janeiro. Apenas 18 senadores votaram contra a indicação de Zanin.

Os números da votação mostram por si mesmos a falácia da narrativa desonesta e mentirosa disseminada pela rede de agentes bolsonaristas de desinformação, que há meses disseminam a mentira de que Jair Bolsonaro teria conseguido eleger uma “forte bancada de direita” nas eleições recentes, como mostra o print abaixo:


Mentiras como a desse perfil acima reproduzem-se aos milhares nas redes sociais, com a finalidade de enganar e iludir milhões de pessoas. Uma mentira tão deslavada que não resiste a um exame atento dos fatos políticos, que mostram a convergência de interesses e intenções tanto de bolsonaristas quanto de petistas.

Vários episódios recentes não deixam dúvida sobre o que de fato temos hoje no cenário político: temos duas forças políticas majoritárias no campo da esquerda, o petismo e o bolsonarismo, que aprofundaram e aprimoraram a antiga estratégia das tesouras tucano-petista.

No caso do bolsonarismo, a estratégia foi aprofundada de um modo tal que os quase extintos tucanos jamais conceberiam: o bolsonarismo consegue falar para o eleitorado de direita, alcançando um público que a esquerda convencional não alcançaria, ao mesmo tempo em que atua como principal força de sustentação política do governo petista.

Observe-se que todas as matéria e iniciativas de importância estratégica para o governo petista tiveram apoio da bancada bolsonarista no Congresso Nacional. A mesma bancada que os agentes da rede bolsonarista de desinformação chamam de “oposição de direita”.

O governo petista pôde contar os valiosos préstimos da bancada bolsonarista para a mudança da Lei das Estatais que permitiu a Aloizio Mercadante assumir a chefia do BNDES. Contou também com votos de bolsonaristas para  aprovação da lei do arcabouço fiscal, bem como para a sobrevida ao PL2730 das Fake News, além dos votos para chancela de novos embaixadores, para a cassação de Deltan Dallagnol.

O apoio bolsonarista para a aprovação do nome do Dr. Cristiano Zanin para o o STF deu-se de modo escancarado, não tendo havido nem mesmo preocupação em simular uma oposição fake.

Diante destes fatos, somente os muito ingênuos ainda acreditam que existe uma real oposição política do bolsonarismo ao governo petista. Somente os ingênuos e aqueles que são enganados pela rede de agentes desinformantes do bolsonarismo acreditam mesmo na materialidade dos embates entre bolsonaristas e petistas.

Esses embates puramente retóricos não passam de encenação entre dois atores desempenhando o mesmo script teatral e irmanados no mesmo projeto político. Os embates servem apenas para alimentar e manter mobilizada a base eleitoral de cada um dos falsos oponentes.

A própria CPMI do Oito de Janeiro tem grande probabilidade de ser reduzida ao teatro deste embate retórico do bolsonarismo versus petismo. Até por que, a comissão de inquérito não era de interesse do governo desde o começo do ano, e continua sendo sem interesse ou “utilidade” para os petistas, por uma razão óbvia:

A esquerda petista não precisa esperar o resultado de uma comissão de inquérito para ver punições serem aplicadas aos bolsonaristas. O próprio Judiciário já “formou entendimento” sobre o tratamento que vai ser dado aos envolvidos direta ou indiretamente aos envolvidos no episódio do Oito de Janeiro.

Além disso, o próprio Jair Bolsonaro corre risco de ter seus direitos políticos cassados por por oito anos, independentemente das conclusões de qualquer comissão parlamentar de investigação. Logo, a única “utilidade” da CPMI do Oito de Janeiro será manter tanto a base petista quanto a base bolsonarista, bem como a grande imprensa, entretidas com as guerras de narrativas que serão geradas, guerras estas que são úteis aos dois lados, que assim se desobrigam de tratar dos reais problemas do país.

O que o futuro pode nos reservar?
Diante disso, que perspectivas podemos ter para o futuro político? Elas não são muito promissoras, deve-se admitir. Mas também não abraçamos a ideia completamente errada e enganosa de que “não existe solução na política”, pois segundo essa ideia “o sistema vai engolir qualquer um que entre”, ignorando o fato de que o sistema somente engole quem é engolível, por ser moralmente corruptível.

Esse fraseado costuma ser repetido e papagaiado com ares de sabedoria superior por diletantes do tipo templários de apartamento, que muitas vezes ainda o fazem evocando indevidamente o nome do professor Olavo de Carvalho, como se o professor tivesse ensinado alguma “fórmula matemática” para fazer política, coisa que ele nunca se propôs a fazer.

Mas então, o que o futuro político pode nos reservar? Resposta pronta não existe, mas podemos ter em mente ao menos alguns pontos básicos:

1) Os conservadores precisam romper em definitivo com o flagelo do bolsonarismo e procurar se organizarem numa estrutura política partidária sólida.

2) Precisamos romper com o discurso reativo exclusivamente ideológico e definir uma plataforma política mínima a ser apresentada à sociedade, oferecendo soluções concretas para os problemas reais vividos pela maioria dos brasileiros.

3) Precisamos, para ontem, romper como método bolsonarista de fazer política, pois este método já se mostrou fracassado e não serve como modelo de atuação para uma direita democrática séria e adulta que aspire constituir-se como alternativa de poder no país no médio prazo.

4) É necessário formar e capacitar uma militância para todas as dimensões da atuação política, que incluem desde base teórica sólida, até estruturas profissionais de inteligência de informações, além da necessidade de se auto-financiar de modo eficiente.

Estas devem ser, em nosso entender, as preocupações dos conservadores neste momento, que precisar parar de perder tempo com a falsa guerra de narrativas alimentada pelo bolsonarismo versus petismo, pois este falso embate somente serve para imobilizar e paralisar a formação de uma autêntica direita.

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