Parte da direita em anos recentes tem estado tão preocupada em “combater o globalismo”, que esqueceu-se até mesmo de preservar e reafirmar suas balizas morais que justifiquem este combate, reduzindo assim a abordagem de complexos problemas a Guerra da Ucrânia a uma torcida contra ou a favor deste ou daquele bloco geopolítico.



por paulo eneas
A direita brasileira tem sido alvo de uma intensa ação de desinformação tanto em assuntos políticos internos quanto externos em período recente. A desinformação opera como mecanismo para direcionar posicionamentos políticos, gerar engajamento em assuntos políticos internos e também como ferramenta eficiente para forçar embates de narrativas no nível puramente ideológico, quase sempre sem vínculo algum com os reais problemas da realidade brasileira.

A desinformação sempre foi a arma preferencial do movimento revolucionário, especialmente durante a era da antiga União Soviética, pois ela muitas vezes parte da identificação de problemas reais vividos no Ocidente para, a partir deles, fazer prevalecer as propostas e iniciativas políticas vinculadas a projetos autoritários.

Com a eclosão da Guerra da Ucrânia, a desinformação passou a ser também um elemento revelador da ausência ou insuficiência de balizas morais sólidas em grande parte da direita ocidental, que tem sido alvo diário de um bombardeio de desinformação, às vezes em formato quase amador, para justificar a agressão russa.


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Um exemplo da forma pela qual essa desinformação opera pode ser visto na maneira pela qual parte da direita nacional simpatizante do ditador Vladimir Putin tenta justificar para si mesma esse seu apoio ao ditador partir de estímulos desinformativos proporcionados pela própria rede desinformação russa. A seguinte mensagem, com a tradução mais abaixo, foi colocada no nosso canal do Telegram. O teor e a forma da mensagem tem todos os elementos da propaganda russa, mas vamos supor por hipótese que ela seja verdadeira:


Tradução:
🏳️🌈🇺🇦Today, apresentei ao parlamento ucraniano um projeto de lei sobre a legalização de parcerias entre pessoas do mesmo sexo. Hoje 56% dos ucranianos apoiam parcerias entre pessoas do mesmo sexo! Portanto, espero que a maioria do parlamento, incluindo o partido @ZelenskyyUa, assuma a liderança do povo!

O que podemos depreender deste conteúdo e de quem o divulga como argumento para justificar a invasão da Ucrânia? O que está implícito na mensagem é que, se os ucranianos realmente apoiam tais pautas identitárias, significa então que é justo que o país seja bombardeado, parte de sua população civil assassinada, que milícias estrangeiras do Wagner Group entrem no país e estuprem suas mulheres e crianças e que a própria existência da Ucrânia como nação independente seja colocada em cheque, assim como sua identidade nacional construída ao longo dos séculos.

É esta a lógica implícita ou muitas vezes explícita que está presente na adesão insana que parte da direita brasileira faz às teses duguinistas, até mesmo em nome de valores supostamente cristãos: se a população de um país expressa a “decadência ocidental” representada pelo identitarismo progressista, então essa população deve ser subjugada pela mão forte de um Estado estrangeiro absolutamente autoritário, e parte desta população deve ser dizimada e eliminada fisicamente.

Em que esta abordagem difere de qualquer outra concepção eugenista que motivou experiências de limpeza étnica do início do século passado em nome de uma pureza racial? Agora, em vez de pureza racial tem-se a ambição de pureza ideológica ou comportamental? É este o padrão de “moralidade cristã conservadora” que o duguinismo oferece ao Ocidente e que parte da direita nacional e de todo o Ocidente está abraçando.


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Observe-se que o agente desinformante nem mesmo se preocupou com a “qualidade” da desinformação divulgada, pois sequer observou noções elementares de jornalismo, como informar o que, quando e onde tal fato suposto fato ocorreu.

Além do que, o proponente também ignora que possivelmente deve haver no máximo algumas dezenas de brasileiros que conseguem certificar-se, na fonte original, o dia a dia dos trabalhos legislativos no parlamente ucraniano, até por conta da barreira do idioma.

Note-se ainda que o elemento problemático aqui, no que diz respeito ao conteúdo não explícito da mensagem, não é sua visível intenção de desinformação. Qualquer pessoa na direita que conheça minimamente a história do movimento revolucionário sabe que o uso da desinformação é um instrumento corriqueiro da parte dos comunistas.

O elemento novo e problemático aqui é que a adesão a esta desinformação quase amadora expressa uma vacuidade moral de quem a ela adere. É como se parte da direita em anos recentes tivesse estado tão preocupada em “combater o globalismo”, que esqueceu-se até mesmo de preservar e reafirmar suas balizas morais que justifiquem este combate, reduzindo assim a abordagem de complexos problemas como esta guerra a uma torcida contra ou a favor deste ou daquele bloco geopolítico.



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