Todo discurso político, principalmente aqueles proferidos por lideranças de extração mais populista, contêm sempre dois significados: um significado manifesto, extraído da interpretação literal do discurso. Esse significado manifesto, de natureza primária, tende a ser absorvido pela militância política e pelo grosso do eleitorado, pois em geral vem ao encontro de seus anseios.

O segundo significado do discurso não é necessariamente oculto, mas está cifrado na forma textual do primeiro e é destinado a outros agentes políticos, sejam eles aliados ou adversários ou mesmo inimigos.

Apontamos a presença desses dois sentidos do discurso em toda a campanha de Donald Trump. Se esta interpretação nossa estiver correta, o apelo feito n semana passada pelos grupos terroristas Hamas e Hezbollah para que Donald Trump ponha um fim à guerra que estes grupos travam contra Israel confirma nossa tese, como mostramos no artigo a seguir.


por paulo eneas
Logo após a confirmação da vitória de Donald Trump na eleição presidencial dos Estados Unidos da última terça-feira (05/11), o grupo terrorista Hamas pediu o fim imediato da guerra que o grupo, juntamente com o Hezbollah, empreende contra o Estado de Israel e o povo judeu.

Em comunicado emitido no dia seguinte à eleição e usando o tom cínico que lhe é habitual, o grupo terrorista Hamas afirmou esperar que Donald Trump “aprenda com os erros de Joe Biden” no que diz respeito ao conflito no Oriente Médio.

O grupo ainda reafirmou sua reivindicação de reconhecimento de um Estado “palestino” nos territórios israelenses de Samaria e Judeia e tendo a cidade de Jerusalém como sua capital, e fez a ameaça de que o apoio [por parte dos Estados Unidos] a Israel desestabilizará a região.

No mesmo dia do comunicado, Mahmoud Abbas, presidente da Autoridade Nacional Palestina, que é formalmente responsável pelo governo de Gaza, parabenizou Donald Trump pela vitória nas eleições.

No mesmo tom adotado pelo Hamas, o grupo terrorista Hezbollah declarou acreditar que o próximo presidente americano terá supostamente mais autoridade do que a candidata democrata derrotada, Kamala Harris, para frear o que chamam cinicamente de “a guerra de Israel no Líbano”. A avaliação foi feita por um dirigente do grupo terrorista à agência de notícias italiana ANSA.

Durante seu primeiro mandato presidencial, Donald Trump formalizou o reconhecimento pelos Estados Unidos da cidade de Jerusalém como capital do Estado de Israel, transferindo a embaixada americana para a cidade santa. Trump também suspendeu a ajuda financeira à agência da ONU para os refugiados “palestinos” (UNRWA), e reduziu o financiamento a projetos de desenvolvimento na Cisjordânia e em Gaza.

O que os comunicados dos grupos terroristas revelam
Para além das formalidade protocolares, os comunicados dos grupos terroristas que combatem Israel revelam alguns pontos que merecem ser explorados. Primeiro é preciso entender que o apoio dos Estados Unidos ao Estado de Israel sempre existiu desde a criação do estado judeu em 1948.

Os Estados Unidos foram o primeiro país a reconhecer o Estado de Israel quando de sua criação: o então presidente norte-americano Harry Truman reconheceu o novo país apenas 11 (onze) minutos após David Ben Gurion ter proclamado a declaração de independência e fundação do Estado de Israel em 14 de maio de 1948.

A aliança estratégica entre Estados Unidos e Israel foi firmada a partir de 1967, quando da Guerra dos Seis Dias. O então secretário de Estado norte-americano Henry Kissinger desempenhou papel central nesse processo. A aliança foi aprofundada a partir de 1972, quando da Guerra do Yom Kippur, que ocorreu em meio à primeira crise internacional do petróleo, e se manteve desde então, independentemente do presidente americano ser democrata ou republicano.

Mas esta aliança sempre foi marcada por tensões, principalmente pela necessidade dos Estados Unidos de desempenhar uma influência ativa e o papel de mediador de conflitos no Oriente Médio. Haja vista que o segundo parceiro estratégico dos americanos no Oriente Médio é a Arábia Saudita, de maioria islâmica sunita.

Estas tensões se traduzem pela imposição, por parte da Casa Branca, de limites de atuação ao Estado de Israel nas suas ações de defesa. É sabido que Israel possui capacidade militar e de inteligência de informações para liquidar de vez com os principais grupos terroristas que atual no Oriente Médio. Ele só não o faz por pressão contrária vinda de Washington.

Desde o ataque terrorista do Hamas contra civis israelenses em 7 de Outubro do ano passado, a Casa Branca sob Joe Biden aparentemente afrouxou as pressões contrárias no que diz respeito ao Hezbollah, mas continuou impondo restrições a atuação israelense contra o Hamas na Faixa de Gaza.

Observe-se que sem as limitações impostas por Washington, as forças israelenses conseguiram praticamente eliminar em poucas semanas com todos os principais dirigentes do Hezbollah e debilitar enormemente o poder de fogo do grupo terrorista xiita, que é inúmeras vezes mais poderoso que o Hamas, por ser armado e financiado pelo Irã e pela Rússia.

Em suas ações contra o Hezbollah, Israel conseguiu apoios pontuais de países muçulmanos sunitas, como Arábia Saudita e Jordânia, uma vez que o Hezbollah enxerga nos muçulmanos sunitas inimigos a serem também destruídos, junto com o estado israelense.

Um observador externo e atento deveria se perguntar por que Israel teve a capacidade de debilitar enormemente o Hezbollah, mas “não consegue” resolver o problema da Faixa de Gaza, controlada pelo muito mais débil grupo terrorista Hamas. A resposta a esta pergunta está na Casa Branca, onde o lobby “palestino” tem um poder enorme, especialmente nos governos democratas.

Portanto, é bastante provável que esses pedidos por “fim da guerra” que os grupos Hamas e Hezbollah estão fazendo agora sejam apenas um apelo à volta ao status quo anterior das relações entre israelenses e americanos, em que as ações israelenses eram mais restringidas pela Casa Branca.

Os comunicados a meu ver revelam uma janela de oportunidade que os grupos terroristas estão enxergando no discurso de “acabar com as guerras” que marcou a campanha vitoriosa de Donald Trump.

Uma janela de oportunidade para que estes grupos possam continuar sobrevivendo, pois avaliaram que sem as restrições impostas pela Casa Branca, e que aparentemente Joe Biden, por sua fragilidade, não conseguiu manter, as forças de Israel podem dizimar com todos estes grupos no curto prazo.

Óbvio que ninguém pode ser contra acabar com as guerras. Mas a que custo? Ao custo de permitir que grupos terroristas continuem existindo para matar e sequestrar civis israelenses? Acabar com as guerras significa impor a um país invadido, no caso a Ucrânia, que aceite os termos de rendição impostos pelo agressor russo e abra mão de porções de seu território e de sua soberania nas relações internacionais?

São essas ambiguidades e incertezas nas falas de Donald Trump que precisam ainda ser destrinchadas e avaliadas quando do início de seu segundo mandato a partir de janeiro do ano que vem. Ambiguidades que são tão patentes que até mesmo grupos terroristas como Hamas e Hezbollah estão procurando delas se aproveitar para assegurar a sobrevivência desses grupos.

Por fim, cabe observar que o comunicado do Hezbollah fala em “guerra de Israel no Líbano”. É preciso ter claro que nunca houve guerra entre Israel e Líbano. As ações de Israel visam combater os grupos terroristas que ocupam o sul libanês desde o episódio do Setembro Negro de 1973, que relatamos em texto em nossa rede social no ano passado e que pode ser visto no link a seguir. Colaboração Angelica Ca.


COLABORE CONOSCO FAZENDO
UMA DOAÇÃO NO PIX: 483.145.688-80

O livro é possivelmente a primeira obra publicada expondo a verdadeira face do bolsonarismo, sem render-se às narrativas delirantes criadas pelos bolsonaristas em torno da figura do “Mito” e sem ceder às narrativas puramente retóricas para fins de guerra política que são usadas pela esquerda. Clique na imagem para ver resenha completa e informações onde adquirir seu exemplar.

Inscrever-se
Notificar de

1 Comentário
Feedbacks embutidos
Ver todos os comentários