Analisamos aqui a política externa norte-americana para o Oriente Médio a partir de uma fala de Donald Trump esta semana, que mostra que se a diretriz a ser seguida pelo seu futuro governo for aquela que ele tem sinalizado, o inferno a que se referiu o futuro presidente americano será pago não pelos terroristas, mas pelos israelenses e demais povos da região.


por paulo eneas
O presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, continua exercendo suas bravatas e blefes de flame war sobre temas importantes como comércio internacional e política externa mesmo após já ter vencido a eleição presidencial de novembro passado. Esses blefes têm criado expectativas sobre seu futuro governo que são exacerbadas o bastante para exigir um exame mais crítico da parte do público mais racional e não apaixonado por políticos.

Na segunda-feira (02/12) Donald Trump fez declarações inflamadas em rede social exigindo a libertação imediata dos reféns israelenses mantidos em cativeiro na Faixa de Gaza pelo grupo terrorista Hamas desde outubro do ano passado. Donald Trump ameaçou os terroristas com um “um inferno a pagar” no Oriente Médio se a exigência não for atendida até a data de sua posse, em 20 de janeiro do ano que vem.

Pois bem, enquanto Donald Trump impressiona sua base eleitoral e fornece pautas saborosas para a imprensa com sua retórica inflamada, emissários do futuro presidente norte-americano já fizeram chegar ao Governo de Israel que a futura administração da Casa Branca irá exigir um cessar-fogo imediato na Faixa de Gaza.

Ou seja, como ocorre há décadas nas relações entre o Estado de Israel e os Estados Unidos, Donald Trump mandou avisar que novamente vai colocar rédeas curtas sobre o governo israelense impedindo-o de fazer um real enfrentamento aos grupos terroristas.

Como a história do Oriente Médio nas últimas décadas tem mostrado, não se combate grupos terroristas fazendo ameaças verbais a eles e muito menos negociando e fazendo concessões, como a administração anterior de Donald Trump fez com o grupo terrorista Talibã no Afeganistão (ver nota abaixo).

Terrorismo se combate eliminando terroristas, ponto. Se Donald Trump, e de resto toda a classe política norte-americana, incluindo Democratas e Republicanos, estivessem mesmo comprometidos com o extermínio dos grupos terroristas do Oriente Médio, tirariam as amarras e chantagens que sempre impuseram ao Estado de Israel e deixariam o governo israelense livre para fazer o que precisa ser feito.

O Estado de Israel é o único país do mundo que possui a capacidade militar e principalmente de inteligência de informações para não apenas liquidar com os grupos terroristas como Hamas, Hezbollah e Jihad Islâmica, como para desmantelar por meio de ações de inteligência interna o programa nuclear iraniano, que é o principal fator de desestabilização e ameaça à segurança de todos os países da região, incluindo os países muçulmanos sunitas.

Mas por que nada disso é feito? Por que a realidade do Oriente Médio consiste numa tensão permanente que é sustentada de um lado por Moscou e seu apoio aos grupos terroristas e ao regime iraniano. E de outro lado pela política externa ambígua que a Casa Branca sempre manteve para a região, seja sob administrações democratas ou republicanas.

Nada indica que essa política externa ambígua irá mudar sob Donald Trump II: grupos terroristas continuarão existindo e ameaçando a segurança e a vida de civis judeus, cristãos, drusos e muçulmanos de toda região, e o Irã provavelmente continuará avançando com seu programa nuclear sob a batuta de Moscou.

Quanto à Casa Branca, continuará com suas ameaças verbais e eventualmente uma ou outra ação pontual para consumo do público político interno. O fato é que inferno a que se refere Donald Trump continuará sendo pago, mas não pelos terroristas, mas pelos povos da região, em especial os israelenses. Colaboração Angelica Ca.


Nota:
A saída dos Estados Unidos do Afeganistão e a entrega daquele país aos terroristas do Talibã foi uma decisão do primeiro governo Donald Trump, executada meses depois pela administração Joe Biden. O vídeo abaixo traz trecho de entrevista com um oficial que participou das negociações.

O vídeo foi divulgado, com legendas em português, mostrando o que seria uma suposta habilidade de negociação de Donald Trump, e foi elogiado por quase toda a direita brasileira. Ao nosso ver, trata-se do contrário: o vídeo é um exemplo de um erro grotesco de política externa isolacionista que Donald Trump já adotava em seu primeiro mandato e que provavelmente irá adotar de modo mais aprofundado em sua próxima gestão à frente da Casa Branca.

pic.twitter.com/R9JBFPLnP6


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