por paulo eneas
A candidata de centro, ou terceira via, das eleições presidenciais argentinas, Patricia Bullrich, anunciou esta semana seu apoio ao candidato populista Javier Milei para o segundo turno das eleições presidenciais portenhas contra o candidato governista peronista Sergio Massa. Bullrich ficou em terceiro lugar no primeiro turno, com 23% dos votos.

O apoio de Bullrich a Javier Milei já era esperado pela maioria dos analistas. De nossa parte sempre mantivemos algum ceticismo quanto à efetividade deste apoio, dado o caráter ambíguo das propostas de Milei e o perfil histriônico e caricato do candidato.

Ao mesmo tempo, deve-se ter em conta que Bullrich faz parte do mesmo bloco político do ex-presidente Maurício Macri, adversário do peronismo. O fato é que apoio da candidata do centro, se efetivado, aumenta consideravelmente as chances de vitória de Javier Milei contra o candidato governista. No entanto, existe uma série de problemas que precisam ser apontados:

Apesar de muitos analistas, inclusive do mercado financeiro brasileiro, estarem otimistas com Javier Milei por conta do ranço (totalmente justificado) com os Kirchner, há alguns pontos de seu plano de governo que são problemáticos.

Caso Milei vença e leve adiante a proposta de extinção da autoridade monetária (o banco central) e a dolarização da economia argentina, o resultado poderá ser desastroso dentro das atuais circunstâncias fiscais do país.

Um desastre que poderá ser semelhante àquele vivenciado pelos argentinos no período de Domingo Cavallo, ministro da economia do peronista Carlos Menem, que estabeleceu em meados da década de noventa a equivalência um-a-um da moeda argentina com o dólar. Uma equivalência que na prática representou um câmbio fixo, com emissão permanente de pesos. O resultado foi desastroso.

Poucos anos depois, Cavallo voltou a comandar a economia argentina por vinte e poucos dias no governo de Fernando de la Rúa, quando implantou em 2001 o chamado “corralito”, que foi um confisco parcial dos ativos financeiros dos cidadãos depositados nos bancos.

O resultado foi desastroso e levou à iminência de uma convulsão social, que acarretou a renúncia do então presidente Fernando de la Rúa, horas após ter decretado Estado de Sítio no país.

No mesmo dia em que recebeu o apoio da candidata do centro, Javier Milei anunciou sua intenção de incorporar a esquerda em seu futuro governo. Falando de modo visivelmente improvisado, Milei disse em entrevista a uma emissora de rádio que pretende criar um Ministério de Recursos Humanos para ocupar-se das áreas que, segundo ele, a esquerda possui mais capacitação.

Essas enormes contradições são o sintoma de um mal do qual os argentinos padecem há décadas: uma classe política corrupta, populista, patrimonialista e progressista, cujas práticas políticas sejam da direita ou da esquerda giram em torno da herança do flagelo do peronismo, a versão portenha do getulismo brasileiro.

Em que pese as simpatias de alas da suposta direita brasileira, o mais provável que Javier Milei, se vencer o pleito, será apenas mais um espirro desse flagelo, um espirro com rótulo “de direita” que irá apenas aprofundar a crise que a Argentina vive há décadas e abrir uma janela de respiro para a volta da esquerda. Já vimos esse script na América Latina.

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