por paulo eneas
O ex-presidente Jair Bolsonaro sinalizou na semana passada que ele e o Partido Liberal não iriam colocar dificuldades para a aprovação das propostas legislativas do Governo Lula no Congresso Nacional. Por meio de outras palavras, Jair Bolsonaro afirmou que na prática a proclamada “oposição de direita” no Congresso Nacional não irá fazer oposição.
A primeira sinalização já foi dada há cerca de um mês quando a bancada bolsonarista deu sobrevida ao PL2630 das Fake News, que poderia ter sido derrotado em plenário em sessão convocada para sua votação, mas foi retirado de pauta a pedido do relator Orlando Silva (PCdoB-SP), com a concordância dos bolsonaristas.
O outro sinal evidente do acordo que está sendo costurado envolve a CPMI do 8 de Janeiro: já desde antes da criação da comissão dizíamos que nem bolsonaristas nem petistas tinham real interesse na comissão, e que toda a retórica em torno da coleta de assinaturas destinava-se unicamente a media happening para gerar engajamento em rede social.
A dois dias da instalação efetiva da comissão, tanto bolsonaristas quanto petistas fazem “corpo mole” na indicação de seus membros, indicando assim que ambos os lados irão operar para esvaziar a comissão ou no máximo reduzi-la a um palco para holofotes compartilhados.
O fato é que tanto os bolsonaristas e o Centrão quanto os petistas têm interesses em comuns neste momento que podem ser atendidos reciprocamente por meio de um acordo tácito. Ao governo petista interesse superar suas visíveis dificuldades no Congresso Nacional e ver suas pautas aprovadas.
Ao Centrão interessa somente aquilo que sempre lhe interessou: posições na máquina pública, que foram amplamente contempladas no Governo Bolsonaro e que não têm sido contempladas a contento no atual governo por conta da diversidade de interesses políticos que levaram o petista Lula novamente à Presidência da República.
Por sua vez, aos bolsonaristas interessa a preservação dos mandatos de seus parlamentares e que Jair Bolsonaro não seja preso ou retirado de vez do cenário político, uma vez que o ex-presidente continua sendo ainda seu maior cabo eleitoral, o que também é de interesse do Centrão.
Observe-se que todos estes distintos interesses convergentes dizem respeito à obtenção do máximo de benefícios que são proporcionados pelo sistema político aos diferentes grupos que fazem parte dele. Nenhum desses interesses diz respeito a questões que envolvem algum projeto de interesse real da Nação.
A prova de fogo deste acordo que está sendo costurado será a votação da PEC do novo arcabouço fiscal. O núcleo duro da proposta do ministro Fernando Haddad é aumentar gastos públicos por meio aumento de arrecadação, de modo a agigantar o Estado e ampliar benefícios sociais. Bolsonaristas não irão colocar objeção a esta ideia central.
O indicativo de que o arcabouço poderá ser aprovado com o apoio da “oposição” foi dado também nesta terça-feira (23/05) em reportagem do site chapa-banca do bolsonarismo Terra Brasil. A reportagem cita fontes do Partido Liberal indicando que a proposta será aprovada com apoio da “oposição”.
A reportagem segue a diretriz chapa-branca do site, ao informar que as fontes teriam afirmado que “a proposta é ruim, mas é o que temos” e que a intenção desta falsa oposição é ser “oposição consciente”.
Trata-se da nova versão do chavão que diz que “a política é a arte do possível”, que serviu de argumento para o então presidente Jair Bolsonaro abandonar as pautas da direita e acelerar as pautas esquerdistas no seu antigo governo. A arte do possível está de volta à cena, agora sob a batuta do petista Lula e sob os aplausos dos bolsonaristas.