por paulo eneas
Um dia após o comício extemporâneo na Avenida Paulista no último domingo (26/11) pela volta de Jair Bolsonaro ao poder, comício este que teve como palanque o esquife de Cleriston Pereira, bolsonarista que morreu no Presídio da Papuda em Brasília (DF) no dia 20 de novembro, onde estava preso por conta dos episódios de 8 de Janeiro, o petista Lula confirmou a já esperada indicação de seu ministro da Justiça, Flavio Dino, para a vaga em aberto de ministro do Supremo Tribunal Federal.
O nome de Flavio Dino saiu fortalecido para o supremo em período recente em grande parte por conta dos parlamentares bolsonaristas que, iniciado o governo petista, escolheram Flavio Dino como alvo de suas investidas retóricas, acreditando que seria fácil enquadra-lo.
Obviamente a estratégia foi um desastre, pois sendo o político experiente que é, Flavio Dino ficou meses literalmente sapateando em cima do amadorismo e despreparo da bancada bolsonarista e com isso ganhou projeção nacional, gerando até mesmo desconforto em outras áreas do governo e principalmente entre os petistas.
Este protagonismo não planejado de Flavio Dino fez ele “cair para cima”, consolidando seu nome para o judiciário como forma de remove-lo do rol de possíveis sucessores do petista Lula. Desta forma, os bolsonarista ajudaram os petistas a resolver um problema político interno enquanto achavam que “combatiam a esquerda”.
Além da confirmação da indicação de Flavio Dino para o STF, o petista Lula confirmou a indicação de Paulo Gonet como novo Procurador-Geral da República. O nome de Gonet tinha preferência entre os magistrados, enquanto a cúpula petista endossava o nome de Antônio Carlos Bigonha, que já foi elogiado até mesmo por deputados bolsonaristas, conforme mostramos no artigo Antonio Carlos Bigonha É o Nome da Cúpula Petista Para Procuradoria-Geral da República, publicado em setembro.
Tudo indica que o petista Lula negociou um entendimento atendendo uma expectativa do judiciário por meio da indicação do procurador Paulo Gonet para a PGR em troca da aceitação do nome de Flavio Dino como próximo integrante da corte.
Desse eventos concluímos que o comício bolsonarista disfarçado de manifestação “pelo estado democrático de direito” no último domingo teve efeito zero, uma vez que não exerceu papel algum na arbitragem do aparente conflito entre judiciário e executivo por conta da emenda constitucional das decisões monocráticas. Exatamente conforme havíamos antecipado.
Esta sequência de fatos obriga também a direita, ou ao menos aquela parte pensante que restou dela, a considerar a necessidade urgente de abandonar seu fetiche bolchevique por manifestações de rua e entender que política tem a ver com ações capazes de impactar na vida das pessoas e nas relações de poder.
Exceto circunstancialmente e de modo não decisivo em períodos eleitorais, manifestações de rua têm impacto zero nos rumos da política, como os fatos evidenciam. Manifestações não são meios de conquistar o poder e muito menos de exercê-lo. Manifestações de massa apenas medem a disposição de uma parcela dos eleitores de um político em saírem de suas casas e irem ouvi-lo falar num palanque.
Os críticos mais ingênuos afirmam que o petista Lula não reúne multidões na ruas em seu apoio. Pergunta-se: Lula iria se ocupar disso para quê? Se ele já detém os meios de exercer o poder e se usa esse meios, inclusive a maioria no Congresso Nacional formada por parlamentares eleitos pelo bolsonarismo, que necessidade o petista tem de mobilizar massas em seu apoio?
A própria afirmação desses críticos ingênuos, de que o petista Lula “não consegue” reunir multidões, já é em si uma demonstração da incompreensão da natureza do poder e quais os verdadeiros instrumentos para seu exercício.
Cabe pois, então, à direita compreender a real natureza do poder e rever seus métodos de atuação que são baseados em premissas falsas, como a ilusão de acreditar que comícios de rua, disfarçados de manifestações, podem afetar as relações de poder.